terça-feira, 3 de setembro de 2019

Suicídio - como a literatura pode ajudar.


Tirar a vida antes do tempo, não é o que as pessoas querem e sim, ficar livre do sofrimento. Como prevenir? Falar sobre o suicídio. 

Neste particular, a literatura tem papel importante. A ficção existe, mas, se inspira na realidade, logo, se nada falar de suicídio, o tabu não se quebra. Obras de sucesso mundial abordaram o assunto: Shakespeare em Romeu e Julieta e Tolstói em Anna Karenina. Na obra intitulada Os sofrimentos do jovem Werther”, o autor Johann Wolfgang von Goethe, o protagonista, sem livrar-se da paixão arrebatadora pela amada, dá cabo da própria vida, sendo fonte de inspiração dos jovens da época, preferiram ter o mesmo fim de Werther, seguindo seus passos de fuga e escapismo, tendo o livro sido proibido, queimados em praça pública, e a expressão Wertherfieber, ou Efeito Werther, passou a ser utilizado na literatura técnica para designar os suicídios que seguem um modelo, isto é, são imitativos, e naquela época a literatura, era a mídia de hoje.
Em “O Mito de Sísifo”, Albert Camus descreve o ato como a única questão filosófica realmente séria: “Julgar se a vida vale ou não a pena ser vivida”, e pergunta: “Será que a realização do absurdo exige o suicídio? E Camus responde: "Não. Exige revolta". Ele então descreve várias abordagens do absurdo na vida e no último capítulo compara o absurdo da vida do homem com a situação de Sísifo, um personagem da mitologia grega condenado a repetir eternamente a tarefa de empurrar uma pedra até o topo da montanha, sendo que, a pedra rolava novamente montanha abaixo até o ponto de partida, invalidando completamente o duro esforço despendido. Assim, Camus chega a três consequências da plena aceitação do absurdo: a revolta, executa-se a tarefas diárias; a liberdade, concernente a nossa condição humana, e a paixão já que não se vive a vida de outro modo, endossando, que a literatura tem papel importante no processo, servindo de inspiração, compartilhando narrativas de transtornos psicológicos para sensibilizar e informar, não só aos pacientes, mas, confortar quem convive com eles, e há inúmeros livros que podem auxiliar no tratamento dos males que levam ao suicídio. Um romance que conte a situação como ela é, com personagens que se sintam tão deprimidos quanto a pessoa que passa por esta situação, ou com uma visão de mundo inflexivelmente desoladora, dá o toque, o estímulo, e o apoio, para que se senta mais gentil consigo mesma, para que possa acompanhá-la a seu lugar melancólico e escuro, se reconhecendo e articulando, o “não sou só eu”, outros já estiveram ali e, afinal, “ não sou tão diferente”, “não estou sozinha”. Biblioterapeutas entram em cena, a indicar obras tipo: “A Insustentável Leveza do Ser”, de Milan Kundera, “Ao Farol”, de Virgínia Woolf, e “O Olho Mais Azul”, de Toni Morrison, mas, se a ficção não for o bastante, há poemas, contos e crônicas para quem convive com uma doença psicológica, ou luta contra o comportamento suicida. E a literatura compartilha histórias, no que diz respeito à experiência, superação e aprendizado, honrando as memórias daqueles que convivem ou conviveram com o suicídio. O que não falta na literatura são exemplos das realidades que muitos preferem ignorar, e como exemplo citamos “A Redoma de Vidro”, de Sylvia Plath, uma jovem brilhante chega em Nova York para estagiar, e o fascínio daquele mundo, cai na inatingível realidade. A história, não se confunde, é da própria autora, que também foi estudante exemplar, garota normal, bom emprego, boas perspectivas profissionais, festas e noitadas, ótimos relacionamentos, amorosos e de amizade, mas, sofreu com grave depressão, e tudo aquilo não significou nada, por não estar bem consigo mesma e com o mundo ao seu redor, gerou um grande vazio, que a leva ao fundo do poço.  Leitura difícil, profunda, triste e pesada, não é uma literatura para descontrair. A carioca Ana Cristina Cesar, poeta e tradutora traduziu alguns poemas de Sylvia Plath e como ela, obteve destaque e sucesso acadêmico, licenciada em Letras, com mestrado em Comunicação, Estudou na Inglaterra, conquistando o mestrado em tradução literária pela Universidade de Essex, mas, como Plath, também possui um lugar no grupo das mulheres trágicas da poesia. Nasceu em uma família culta, e, desde muito jovem, demonstrou grande talento para a poesia: ditava poemas antes mesmo de saber escrever. Ana C., como também ficou conhecida, atirou-se da janela do apartamento de seus pais, devido uma depressão profunda, e seus versos traduzia o que sentia: “Eu não sabia / que virar pelo avesso / era uma experiência mortal”. Um de seus poemas mais conhecidos chama-se “Psicografia”: “Também eu saio à revelia / e procuro uma síntese nas demoras / cato obsessões com fria têmpera e digo / do coração: não soube / e digo da palavra: não digo (não posso ainda acreditar na vida) e demito o verso como quem acena / e vivo como quem despede a raiva de ter visto”. 
O desconforto frente à doença é insignificante se comparado ao alento que um livro causa, mas, serve de contraponto a uma sociedade que insiste em silenciar a depressão e o suicídio.




Um comentário:

  1. Tema difícil.Mas importantíssimo.
    Parabéns pelo artigo!🎗👏🏻👏🏻

    " O desconforto frente à doença é insignificante se comparado ao alento que um livro causa, mas, serve de contraponto a uma sociedade que insiste em silenciar a depressão e o suicídio."
    Triste verdade.😔

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