sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Passeando no bosque



            Para quem conheceu, a oportunidade de passear de novo, àqueles que não, deem tratos a imaginação; convido-os a abrir o portão e entrar. — Vamos!
         
Tela em guache  pintura autoral
Passando por debaixo desta cerca de fícus,  logo à esquerda, repare     este enorme cajueiro,  não cresceu para cima, curvou-se, como a se espreguiçar, o que facilita para subir no tronco, sentar, e escolher  este aqui amarelo avermelhado,  castanha grande,  não a jogue fora, junte para depois assar. Vamos descer! Veja este enorme pendão, saído desta planta, que não sei o nome, ao contrário do cajueiro, o pendão parece querer alcançar o céu, se parece com estes pés de pita, cuidado com os espinhos! As vizinhas pedem as folhas, serve para dar banho em cachorro com doenças, queda de pelo. Veja os sabiás, comendo aquele mamão maduro! Ali os sanhaços comem as goiabas brancas. — Puxa, quantas jacas, algumas se recostam até  embaixo, aqui  na raiz. — Este pé é de jaca dura.  — E isto? — É abiu, coma um, mas, cuidado com o visgo! Do lado direito veja estas mangueiras! Esta enorme é manga espada graúda; esta ao lado também, só que é espadinha, o bom é assim, comê-las aqui em cima mesmo sem deixá-la cair; já a carlotinha, ali de fronte da casa, podemos pegá-las assim, devido ao talo longo que com o peso bate quase no chão. Voltemos ao caminho principal, isto é manacá, e este pé é cedro. — Parece uma árvore de natal! Ali, margaridas brancas dão contorno ao jardim, as flores brancas  em cachos, são bouquet de noiva, mas, vamos por ali junto à cerca, vou te mostrar um pé de jambo que nunca deu fruto, papai disse que está de pirraça,  só vai dar depois que a gente mudar ; aqui é romã, isto é urucu, serve para temperar o arroz. — Você falou em arroz, e estou sentindo um forte cheiro de alho! — Parece, mas não é, o cheiro vem da casca desta árvore, chama-se pau d’álho, mamãe diz servir de pára-raios. —Vocês fizeram alguma fogueira neste espaço aqui? — Sim, nestas  noites frias de junho e julho, papai  corta os tocos, deixa-os aqui  prontos para armarmos a fogueira, geralmente em um dos dias de Santo Antônio, São João ou  São Pedro, depende de quando está em casa, aí é aquela farra, colocamos debaixo das cinzas quentes, o aipim, a batata doce, e a cana, colhida ali mesmo junto à casa. —Isto é inhame! — Pensei que não conhecesse! Cozido, é só colocar melado por cima, e lamber o beiço! — Vocês soltam balões? — Só japonês. — E fogos? — Só estrelinhas, chuveirinhos; cabeça de nego e morteiro só papai solta.  Um dia soltei um buscapé, e ele foi buscar a roupa que mamãe colocara para coarar, tomei uma surra. — Também pudera! — E isto aqui, parece algodão! — O algodoeiro dá em arbustos, esta árvore é uma paineira, a paina também serve para encher travesseiros. Este coqueiro, dá uns coquinhos, chama-se coco “catarro”, apesar do nome é uma delícia, prove! — Que laranja é esta? — É lima da pérsia, quando chove, a gente nem precisa sair de casa, basta esticar o braço da janela da cozinha; cortar os gomos ao meio, e esperar a chuva passar! Estas goiabas vermelhas são as que mamãe prefere para fazer doce, este limoeiro é de limão verdadeiro; lá adiante tem um de limão galego, agora o nosso xodó é este pé de jenipapo, nos dá  esta bela sombra, pode-se comer assim, retirando esta casca fina, depois esta pelica interna junto com  os caroços, que parece com moela de frango, faz-se doce e licor, mas, meu doce preferido sai daqui, deste pé de laranja da terra, mamãe  senta aqui bem na porta da cozinha, usa o avental como cesto, vai descascando uma a uma, tirando tascas da casca e, é daí que inicia o processo do licor; o doce nem te conto, é um processo  todo especial, fica vários dias no sereno, depois ela coloca açúcar cristal, deixa mais uns dias... — Haja paciência! Aqui neste casebre papai guarda  material.  — Este, aqui, interessante, em formato de V? — É carnaúba, com o vento parece se quebrar, e as folhas na ponta do talo, com o tempo se fecham e caem lá de cima em rodopios.  Temos neste bambuzal,  dois tipos de bambu, o fino, que serve para  fazer vara de pescar, e o grosso, mais usado para artesanato; o perigo são as cobras, que aqui fazem seus ninhos. —Cobras! Vamos sair depressa daqui! — Calma! Estamos no final!  — Mas você não disse que vai até o pé do morro?   — Sim, mas dali em diante é só laranja;  temos ainda este pé de  jaca manteiga, onde as abelhas fizeram esta enorme colmeia. — O quê,  abelhas? Ih! Ali também tem outra casa de abelhas! — Naquele pé de abiu, a  casa é de marimbondo. — Caramba! Só perigo em volta. — Eles só atacam, quando a gente ataca, o animal é bem diferente de nós. — Este pedaço lembra um pouco a mata nativa, fria, triste e escura. —Sim, você encontra aqui muitas ervas utilizadas como remédio, para banhos, olha: capim limão, erva de passarinho, guiné pipiu. — E isto aqui, parece café? — E é, raquítico devido a sombra. Cuidado aqui, com este poço artesiano! — Quantos sapos? — Aqui se encontra vários tipos e tamanhos, um sapo martelo, já era nosso conhecido, mexia com ele, ele incha

todo. Daqui destes coqueiros em diante veja é só laranja, são mais de 10.000 m2. — Prove deste, veja que laranja, parece mel; vamos voltar pelo outro lado do bambuzal! Ainda temos este pé de abiu graúdo, esta pitangueira, e  esta  tamarineira; —  só em pensar já fico com a boca cheia d’água. — Êta, azedinho bom! — Vou lhe mostrar, fiz uma pequena horta. — Puxa! alface, abóbora, chicória, erva doce, salsa, cebolinha, tomate, tem até jiló! — É o que me dá mais trabalho, as formigas atacam. — Quantos ovos? — Este galinheiro já foi maior, mamãe está acabando com a criação. — Aquela está chocando? — Sim, e esta outra já está com  os pintinhos. — Que graça! Só um deles saiu com as penas da cor da mãe! — E aí, gostou? — Quem não gostaria? — Então vamos entrar, acho que mamãe fez uns pés-de-moleque, é bom para recuperar as energias, ou você prefere doce de batata doce roxa? — Puxa! A cristaleira é um verdadeiro arco-íris! — Pode escolher pelas cores este é licor de anis, este tangerina, este aqui é o de jenipapo, como lhe falei, qual prefere? Acho que vou dar uma de provador! — Então deixe eu pegar o copo d’água, para não haver mistura na degustação.




Texto do Capítulo "Passeando no bosque"  retirado do meu Livro Álbum de Família  editado em 2002

Um comentário:

  1. Viajando no tempo,nesse passeio.
    Muito boa,a viagem!🤗
    Parabéns!E bela tela!👏🏻

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